E Se… a corte portuguesa tivesse vindo para o Brasil

Você tá ali, cansado da fumaça cinza de São Paulo, das buzinas histéricas e da alegria forçada no transporte público. Decide: vou me mandar. Pega o abadá, enfia uns shorts na mochila, reserva passagem e parte rumo ao Carnaval da Bahia. No aeroporto, já visualiza Ivete no trio, cerveja gelada e aquele sol que faz qualquer adultério parecer justificável. Aí vem o baque: “cadê o passaporte?”
Passaporte? Pra Bahia?
Pois é. Se o roteiro da história tivesse tomado um pequeno desvio, essa cena absurda podia ser real. Salvador talvez fosse outro país. Com bandeira própria, moeda estranha e fronteira com carimbo. E a culpa dessa confusão toda? Uma mistura de ego europeu, sede de poder e um imperador francês com delírios expansionistas.
A bagunça que (sem querer) nos uniu
Lá no século 19, enquanto a Europa se digladiava por pedaços de mapa e coroinhas brilhantes, um certo império decidiu fazer as malas e fugir pro trópico. Literalmente. Milhares de pessoas — burocratas, militares, religiosos, livros, máquinas, um reino inteiro — embarcaram em navios e atravessaram o oceano, abandonando a pátria original pra se esconder no que era considerado quintal de colônia.
Ao pisar por aqui, o rei resolveu abrir os portos, liberar geral e transformar a então colônia num braço oficial do império. O efeito foi imediato: o Brasil, que até então era um monte de capitanias com sotaques e vaidades diferentes, começou a se amarrar num projeto meio improvisado de unidade nacional. Meio na marra. Meio no medo.
Um mapa que podia ser um mosaico
Sem essa fuga real e o consequente puxadinho imperial tropical, o destino da terra brasilis seria outro. Várias regiões com identidade própria provavelmente teriam virado países independentes. A Bahia? Nação garantida, com Carnaval soberano e ministério do axé. O Norte? Talvez um país amazônico próprio. O Sul? Uma república temperada a chimarrão, talvez até grudada no que hoje chamamos de Uruguai.
O centro-sul, com sorte, formaria seu próprio bloco. Mas a tal “unidade brasileira” seria uma ficção nunca escrita. Um mapa sul-americano muito mais parecido com o da vizinha hispânica — cada canto por si, cada um com sua bandeira esquisita.
E o Rio? Uma Olinda com grife
Sem corte, sem imperador, sem a pompa dos fidalgos, o Rio de Janeiro não viraria capital de coisa nenhuma. Sua arquitetura seria mais modesta, seu centro urbano mais colonial, sua aura menos metida. Em vez de palácios e monumentos, talvez só sobrassem igrejinhas e ruas estreitas — tipo uma Olinda com ressaca.
E aquele sotaque cheio de chiado, que virou símbolo de novela das oito e piada pronta pra paulista tirar onda? Provavelmente nem existiria. Sem a elite europeia desfilando arrogância linguística pelas ruas cariocas, a fala do povo seguiria mais uniforme. Imagina um surfista do Arpoador falando igual ao motorista de van em Araraquara. Bizarro, né?
Nordeste livre, abolição precoce?
Se cada região tivesse seguido seu caminho, o poder central que sugava tudo pro Sudeste teria menos alcance. Talvez o Nordeste, livre do cabresto econômico e político, tivesse se desenvolvido mais rápido. A abolição da escravidão, por exemplo, podia ter rolado décadas antes em alguns desses possíveis países — sem depender dos interesses da elite cafeeira que segurou a corrente até o último segundo.
A desigualdade entre as regiões seria menor? Talvez. O drama seria outro, mas pelo menos o enredo não envolveria tanto sofrimento concentrado numa parte só.
No fim das contas…
Se não fosse um francês megalomaníaco metido a conquistador, talvez não tivéssemos nunca virado “Brasil”. Seríamos uma colcha de retalhos patrióticos, vizinhos com históricos em comum, mas cada um com seu presidente, seu hino, seu RG. E olha, talvez até fosse melhor. Ou pior. Mas com certeza mais interessante.
No fim, a pergunta que fica é: será que a gente é mesmo um país… ou só um acidente geopolítico esperando pra se resolver?